CAINDO NA FENDA
acalento cada novo escrito que me nasce
como um filho renascido do pós-morte
alimento
cultivo
fomento
e de repente
por uma fenda na linha onde escrevo
consigo ver
o pátio da casa da infância
(a árvore ainda no jardim)
ouço nítida
a canção da brincadeira de roda na rua
(a voz materna chamando para dentro)
o cheiro de pão fresco no olho da mãe
..
de repente
por uma fenda na linha do tempo onde escrevo
consigo escre(ver) a Vida
(Curiosa)
..
*
porque a Escrevente, vez em quando, precisa sair da realidade.
e o que temos hoje de recursos para isso?
álcool, drogas infinitas ...?
pois! esses já não me fazem ver a fenda ...
escrever é o único vício que me tem feito cair na fenda ...
ultimamente, tenho enchido caderninhos de poemetos,
ao ponto de reescrever uma dezena de vezes
cada escrito para considerá-lo acabado ...
depois de cheio o caderno, tiro as folhas e as jogo ao vento ...
ou as largo nos banheiros do meu trabalho,
ou na sala de espera de um consultório médico,
a fim de que sejam lidas .... objetivo último de qualquer poema ...
e assim consigo sobreviver a mim ...